Saí da agência correndo, deixando para trás alguns assuntos abertos. 21h30 da noite, preciso viver e o trabalho pode esperar. Pego o carro, pego a prancha, pego dois amigos que já me esperavam ansiosos e pegamos a estrada, sentido litoral. Na quarta-feira, São Paulo está em pleno vapor, longe, ainda, da calma que o final-de-semana traz e das filas de carros que, numa sexta-feira à noite qualquer, seguiriam na mesma direção que estávamos indo. Mas ainda é quarta, tenho que trabalhar amanhã e dirigir para praia numa situação dessas me faz sentir meio criminoso, indomável e tristemente desesperado.
A noite está limpa e na mesma estrada, se acumulando no pedágio, para depois se dispersarem pelas saídas da rodovia, milhares de automóveis com trabalhadores voltando para casa, provavelmente cansados, pensando no desconforto de morar longe e na recompensa de dormirem e acordarem, diariamente, próximos a uma praia, uma floresta ou numa rua mais segura. Desistimos de tentar ouvir no rádio o jogo da selecão e focamos nossos assuntos nas previsões metereológicas para o dia seguinte e na razão de os três estarmos ali, ansiosos, ainda com as roupas amaçadas do trabalho: o surf.
Todo final de semana é a mesma coisa. Acordar cedo, dirigir pela estrada, surfar até ficarmos esgotados, estrada novamente, sentido contrário, de volta para a cidade, aproveitando a vista e o sentimento de vitória contra a estagnação, o conformismo e a morte. Muitas vezes desço sozinho, ouvindo um som que acabei de conhecer ou uma banda que já me deixava saudade. Quando chego no meu destino, caio no mar e agradeço por estar vivo e boiando no oceano. Mesmo dividindo o line up com desconhecidos, surfar sozinho te leva a um momento de instropecção e paz, e, na volta pela serra, cercado por mata atlântica, dirigir nem é tão penoso quanto poderia parecer. Eu desceria para o litoral sozinho, quantas vezes fosse necessário, para poder surfar. Não me dói. A razão para sempre fazer isso com amigos é outra.
Nessa quarta-feira, pegamos a estrada, fomos parados pelo guarda-rodoviário, jantamos num drive-thru do Mc'donalds, dormimos em beliches que nos fizeram demorar a pegar no sono, acordamos ainda escuro, surfamos sem tomar café, saímos correndo do mar, trocamos de roupa na calçada da praia, sem banho, entramos no carro e, novamente pela estrada, cortamos caminhões, atravessamos o pedágio, costuramos pelas ruas da entrada da cidade um caminho que fugisse do trânsito e aceleramos em direção a alguma reunião que nos esperava na volta. Os três chegaram às suas cadeiras antes que a mesmice se desse conta. Nos achando especiais por tanta determinação e por acreditarmos, piamente, que a vida é um pouco mais que trabalhar e um pouco menos que qualquer outro plano ambicioso que não seja surfar. É nessa hora que os amigos fazem a diferença. É neles que vejo, espelhada, a minha satisfação.
7.09.2007
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6 comentários:
Well I hope that someday soon
We'll find peace in our lives
Together or apart
Alone or with our wives
And we can stop our whoring
And draw the smiles inside
And light it up forever
And never go to sleep
My best unbeaten brother
That isn't all I see
And then I see a darkness
Oh no, I see a darkness
Do you know how much I love you (opa, menos)
Cause I'm hoping some day soon
You'll save me from this darkness
Criar um script para a própria vida é para poucos. Fazer o que não saiu em nenhuma revista nem jornal é um desafio diário.
Tomara que outras "acontecências"
continuem povoando a sua vida.
Ney
Sempre perseguindo. E muda mesmo.
Muito bom.
Abraço,
Carlinhos
Realmente a gente se sente um criminoso quando foge da rotina e do lugar comum, por isso que dá vontade, e pensamos nisso sériamente sempre, de abandonar tudo e só pegar onda. É muito difícil conciliar a vida de criminoso com a de bom cidadão. É sofrimento. Hoje peguei altas de manhã, quando bateu 8:30, 8:45, comecei a me sentir desconfortável, mesmo sabendo que poderia chegar as 10:45 na agencia que nada iria mudar, aí eu falo...VAI TOMÁ NO CU, o plano tá pronto....
Esqueci mais uma vez, o comentario de cima é meu....LAMBRESI.
Demais, otima ideia, os artigos estão classe AAA, refletem o que o surf nos faz sentir na ALMA.
Abraço,
Bayard.
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