10.03.2008
4.13.2008
CGK 14.04 - 11h45 – Hora local
Mesmo cansado, não resisti. Lá pelas 11h30 da noite de ontem, após ter jantado e brindado a nossa chegada à Jakarta, tomei um banho rápido, entrei num táxi e fui para a cidade. Essa é minha segunda chance de conhecer a capital da Indonésia e dessa vez não iria desperdiçá-la. Jakarta é um lugar comum. Uma obviedade com tudo que uma pessoa pode imaginar sobre uma cidade asiática bombardeada por todo tipo de influência inglesa, portuguesa, indiana e sei lá mais o quê. Se nós brasileiros temos que conviver com o fantasma da colonização e da decorrente falta de identidade realmente pura – se é que isso algum dia já foi possível onde quer que fosse – a vida de um Indonésio de uma metrópole é um verdadeiro inferno.
Aqui se vê o ocidente e o oriente, o dinheiro e a falta dele, a limpeza dos prédios ultra modernos e a poluição de rios aparentemente mortos, Mc Donald’s, Burguer Kings e Starbucks abertos noite a dentro ao lado de quase uma centena de barraquinhas de camelôs, todas viradas para os carros que passam, onde se come o tradicional nasi goreng ou se compra Cialis ou Viagra a preços satisfatórios, como pude ler nos cartazes pregados em cima de cada uma delas, muito bem iluminados que é para não deixar dúvida.
Hoje pela manhã, retiro o The Jakarta Post da frente da porta do quarto do hotel onde estamos hospedados e tento escolher algumas notícias de capa para repetir aqui:
O Partido da Justiça e da Prosperidade foi obrigado a pagar uma multa de uns U$ 110.000,00 a um Comitê de Erradicacão da Corrupção.
O Governador de Aceh junto com o Comandante da Forças Armadas e do Chefe de Polícia desfilaram em elefantes em frente à mesquita da cidade em comemoração dos 803 anos de fundação da mesma. (Essa tem foto.)
E, num pequeno espaço no canto da capa do jornal, a notícia de que o governo bloqueou o acesso ao Youtube, Myspace e outros websites onde se poderia assistir ao filme Fitna e o apelo do editor para que os leitores mandem um SMS para o número +62 811 187 2772 dando sua opinião sobre isso.
Já é quase meio-dia e logo embarcaremos no último trecho aéreo da viagem, até Padang, onde espera o barco que será nossa casa pelos próximos 15 dias. O jetleg dilui minha ansiedade.
Aqui se vê o ocidente e o oriente, o dinheiro e a falta dele, a limpeza dos prédios ultra modernos e a poluição de rios aparentemente mortos, Mc Donald’s, Burguer Kings e Starbucks abertos noite a dentro ao lado de quase uma centena de barraquinhas de camelôs, todas viradas para os carros que passam, onde se come o tradicional nasi goreng ou se compra Cialis ou Viagra a preços satisfatórios, como pude ler nos cartazes pregados em cima de cada uma delas, muito bem iluminados que é para não deixar dúvida.
Hoje pela manhã, retiro o The Jakarta Post da frente da porta do quarto do hotel onde estamos hospedados e tento escolher algumas notícias de capa para repetir aqui:
O Partido da Justiça e da Prosperidade foi obrigado a pagar uma multa de uns U$ 110.000,00 a um Comitê de Erradicacão da Corrupção.
O Governador de Aceh junto com o Comandante da Forças Armadas e do Chefe de Polícia desfilaram em elefantes em frente à mesquita da cidade em comemoração dos 803 anos de fundação da mesma. (Essa tem foto.)
E, num pequeno espaço no canto da capa do jornal, a notícia de que o governo bloqueou o acesso ao Youtube, Myspace e outros websites onde se poderia assistir ao filme Fitna e o apelo do editor para que os leitores mandem um SMS para o número +62 811 187 2772 dando sua opinião sobre isso.
Já é quase meio-dia e logo embarcaremos no último trecho aéreo da viagem, até Padang, onde espera o barco que será nossa casa pelos próximos 15 dias. O jetleg dilui minha ansiedade.
FKT 12.04 – 19h32 – Hora local
Ainda é metade do caminho, talvez nem isso, mas já é alguma coisa. Devagar, as pessoas começam a ficar diferentes umas das outras. Como se obedecendo a uma regra de que quanto mais desenvolvido o país, maior a mistura de figurinos, preferências, etnias, fisionomias e culturas. Mesmo que seja um mix idealizado por alguém com sono num saguão de aeroporto.
“I fucked my american cunt….” Ele diz. “I loved my english romance” a voz feminina responde no meu fone de ouvido. E assim vou tentando domar minhas expectativas em torno do mar quente, dos dias de sol, das ilhas desertas com seus coqueiros contra a realidade do frio cinzento Frankfurt. Me pergunto se não seria melhor ter feito a escala por Amsterdan, mas seria cruel demais todos aqueles cafés e seus produtos de qualidade indiscutível, somados à proibição do gorverno Indonésio – sob a ameaça de pena de morte – de levar o que quer que seja para dentro de seu território. Bem, melhor assim. Peço mais uma caneca de cerveja alemã e espero a chamada pelo vôo que nos levará até Singapura e depois para a primeira cama e chuveiro que verei no espaço de quase 3 dias: o Sheraton Hotel de Jakarta.
Uma surf trip nas férias não é exatamente uma coisa relaxante. Pelo menos a véspera dela. Diz o ditado que você precisa ser alguma coisa antes de fazer alguma coisa e ainda não sei se sou realmente um surfista. Se você olhar para esse esporte da maneira como o enxergo – uma forma de auto expressão, fruto de um momento de intereção com os elementos – acho que ainda não consegui chegar lá. Não sei se alguém que me vê surfar consegue ter uma visão mais transparente da minha pessoa. E era assim que deveria ser. A chegada da viagem só fez deixar esse abismo mais evidente dentre todos os sentimentos que surgem enquanto escrevo sentado nesse avião, sobrevoando o Mar Cáspio, esperando o Dormonid bater. Será que o governo Indonésio tem alguma objecão quanto a isso também? E, ainda mais importante, no Mar Cáspio tem onda?
“I fucked my american cunt….” Ele diz. “I loved my english romance” a voz feminina responde no meu fone de ouvido. E assim vou tentando domar minhas expectativas em torno do mar quente, dos dias de sol, das ilhas desertas com seus coqueiros contra a realidade do frio cinzento Frankfurt. Me pergunto se não seria melhor ter feito a escala por Amsterdan, mas seria cruel demais todos aqueles cafés e seus produtos de qualidade indiscutível, somados à proibição do gorverno Indonésio – sob a ameaça de pena de morte – de levar o que quer que seja para dentro de seu território. Bem, melhor assim. Peço mais uma caneca de cerveja alemã e espero a chamada pelo vôo que nos levará até Singapura e depois para a primeira cama e chuveiro que verei no espaço de quase 3 dias: o Sheraton Hotel de Jakarta.
Uma surf trip nas férias não é exatamente uma coisa relaxante. Pelo menos a véspera dela. Diz o ditado que você precisa ser alguma coisa antes de fazer alguma coisa e ainda não sei se sou realmente um surfista. Se você olhar para esse esporte da maneira como o enxergo – uma forma de auto expressão, fruto de um momento de intereção com os elementos – acho que ainda não consegui chegar lá. Não sei se alguém que me vê surfar consegue ter uma visão mais transparente da minha pessoa. E era assim que deveria ser. A chegada da viagem só fez deixar esse abismo mais evidente dentre todos os sentimentos que surgem enquanto escrevo sentado nesse avião, sobrevoando o Mar Cáspio, esperando o Dormonid bater. Será que o governo Indonésio tem alguma objecão quanto a isso também? E, ainda mais importante, no Mar Cáspio tem onda?
4.04.2008
Indo - Por Gustavo Soares
A oficina fica com a porta aberta, no canto da loja que é simples, com pranchas penduradas por todo lado e alguns móveis lindos de madeira. Entre as pranchas se destaca uma Dick Brewer de uns 7’8, borda grossa, daquelas que aparecem nos filmes clássicos.
O shaper se chama Gregório, e é filho do Carlos Mota – shaper de móveis conhecido em todo o mundo e um pai bacana, que organiza uma surf trip por ano com toda a família para Mentawaii ou outro lugar dos sonhos. O Gregório é muito jovem, não deve ter 25 anos. E parece entender do riscado: em menos de 10 minutos ele me disse que uma certa redistribuição de espessura, especialmente na frente, vai me ajudar na remada final, para o drop.
Ele anota tudo, anota que precisa escrever “Comanche” do lado do meu nome. Até que pergunta, casualmente como tudo até ali, que cor a prancha vai ser.
Que cor? O Edu, que me levou até lá, olha incrédulo:
- Porra, você não pensou em nada?
- Putz.
Na verdade eu esperava chegar na loja e desencanar. Mas não. Saí de lá com a idéia de mandar no dia seguinte o layout da prancha. Pensei: é só imaginar uma folha em branco em forma de prancha, rabiscar umas coisas e escolher a mais bacana. Volto para o trabalho, perco a tarde fazendo layouts. Dezenas deles. Não gosto de nenhum. Toca o telefone: Felipe.
Eu consigo demorar 5 minutos para tocar no assunto da prancha. Ele diz que faremos hoje à noite, lá na casa dele. Eu desligo, aliviado. E saí percebo que ele só ligou para me dar a chance de pedir o favor.
Noite. Chego à casa do Felipe com uma porção de idéias, referências que eu passei à tarde inteira contemplando sem ir a lugar nenhum. Passamos as quatro horas seguintes pensando na prancha. Depois eu largo o Felipe sozinhoe porque já devo estar atrapalhando em vez de ajudar. Mais meia horinha e o cara me chama, com vários layouts novos e loucos e radicais e... sei lá. Gosto de todos, mas não consigo decidir. Fazer três pranchas parece a única solução, Olho para o Felipe, ele dá risada: é por isso que tem tanta prancha branca no line up.
Mais uma sessão de layouts, desta vez na minha casa. Já cheguei com a idéia fixa, um layout inclusive impresso. Mas assim que olho para ele, desisto outra vez. Já faz quase uma semana que encomendei a prancha, olhei pelo menos cinco vezes por dia para cada layout, criei mais tantos outros.
Até que olho para os primeiros, os mais antigos, que ficaram prontos em alguns minutos. Não é que esse aqui parece ótimo? É esse!
Mas o Felipe só vai saber quando a prancha ficar pronta. E ai do filho da puta que não achar bonita.
Escrevi esse texto há quase um ano, quando mandei fazer minha primeira prancha. Não sei porquê esqueci de mandar para o Chasing na época. De lá para cá nosso blog favorito entrou em coma, recuperou a consciência por algumas horas mas voltou a ser vegetal. Se você está lendo, ele voltou à vida e eu me sinto honrado.
Me toquei que encontrar o texto agora, faltando menos de uma semana para o embarque rumo a Indonésia (ou 5 DU, como diz o Bayard), só pode ser o primeiro sinal das muitas coisas boas que vão acontecer nessa viagem.
Quando encomendei a prancha, eu nem sabia que iria fazer parte do barco. Mas a prancha tem formato e rabeta ótimos para usar lá. Então talvez ela já soubesse que eu ía.
Boa viagem para nós, camaradas.
O shaper se chama Gregório, e é filho do Carlos Mota – shaper de móveis conhecido em todo o mundo e um pai bacana, que organiza uma surf trip por ano com toda a família para Mentawaii ou outro lugar dos sonhos. O Gregório é muito jovem, não deve ter 25 anos. E parece entender do riscado: em menos de 10 minutos ele me disse que uma certa redistribuição de espessura, especialmente na frente, vai me ajudar na remada final, para o drop.
Ele anota tudo, anota que precisa escrever “Comanche” do lado do meu nome. Até que pergunta, casualmente como tudo até ali, que cor a prancha vai ser.
Que cor? O Edu, que me levou até lá, olha incrédulo:
- Porra, você não pensou em nada?
- Putz.
Na verdade eu esperava chegar na loja e desencanar. Mas não. Saí de lá com a idéia de mandar no dia seguinte o layout da prancha. Pensei: é só imaginar uma folha em branco em forma de prancha, rabiscar umas coisas e escolher a mais bacana. Volto para o trabalho, perco a tarde fazendo layouts. Dezenas deles. Não gosto de nenhum. Toca o telefone: Felipe.
Eu consigo demorar 5 minutos para tocar no assunto da prancha. Ele diz que faremos hoje à noite, lá na casa dele. Eu desligo, aliviado. E saí percebo que ele só ligou para me dar a chance de pedir o favor.
Noite. Chego à casa do Felipe com uma porção de idéias, referências que eu passei à tarde inteira contemplando sem ir a lugar nenhum. Passamos as quatro horas seguintes pensando na prancha. Depois eu largo o Felipe sozinhoe porque já devo estar atrapalhando em vez de ajudar. Mais meia horinha e o cara me chama, com vários layouts novos e loucos e radicais e... sei lá. Gosto de todos, mas não consigo decidir. Fazer três pranchas parece a única solução, Olho para o Felipe, ele dá risada: é por isso que tem tanta prancha branca no line up.
Mais uma sessão de layouts, desta vez na minha casa. Já cheguei com a idéia fixa, um layout inclusive impresso. Mas assim que olho para ele, desisto outra vez. Já faz quase uma semana que encomendei a prancha, olhei pelo menos cinco vezes por dia para cada layout, criei mais tantos outros.
Até que olho para os primeiros, os mais antigos, que ficaram prontos em alguns minutos. Não é que esse aqui parece ótimo? É esse!
Mas o Felipe só vai saber quando a prancha ficar pronta. E ai do filho da puta que não achar bonita.
Escrevi esse texto há quase um ano, quando mandei fazer minha primeira prancha. Não sei porquê esqueci de mandar para o Chasing na época. De lá para cá nosso blog favorito entrou em coma, recuperou a consciência por algumas horas mas voltou a ser vegetal. Se você está lendo, ele voltou à vida e eu me sinto honrado.
Me toquei que encontrar o texto agora, faltando menos de uma semana para o embarque rumo a Indonésia (ou 5 DU, como diz o Bayard), só pode ser o primeiro sinal das muitas coisas boas que vão acontecer nessa viagem.
Quando encomendei a prancha, eu nem sabia que iria fazer parte do barco. Mas a prancha tem formato e rabeta ótimos para usar lá. Então talvez ela já soubesse que eu ía.
Boa viagem para nós, camaradas.
1.29.2008
1.27.2008
1.20.2008
Menina e Brasileira
Domingo de Chuva e trabalho. Passo na banca de jornal e volto correndo pro carro, encharcado pela chuva que cai pesada, com a nova Surfer debaixo do braço. Em frente ao computador, viro as páginas rapidamente e dou de cara com uma pequena entrevista da Maya Gabeira para a revista. É pequena mesmo. Menos de meia página. E ainda começa dizendo que todo surfista, alguma vez na vida, já se virou para alguém a quem queria desancar e disse:
A. Você surfa como uma menina.
B. Você surfa como um brasileiro.
Após o início promissor, a matéria elogia a garota, mesmo sendo ela A. Garota e B. Brasileira.
A Maya foi vencedora do Billabong XXL, a primeira mulher do mundo a dropar Ghost Threes e coleciona um número sem fim de feitos dignos dos maiores surfistas do planeta. Apesar disso, a Surfer considerou de bom tamanho fazer uma entrevista de apenas meia página com ela e ainda avacalhar todos os atletas do país da entrevistada. Assim, de graça.
Não por desforra, mas por puro respeito e admiração, o Chasing presta aqui a sua homenagem.
A. Você surfa como uma menina.
B. Você surfa como um brasileiro.
Após o início promissor, a matéria elogia a garota, mesmo sendo ela A. Garota e B. Brasileira.
A Maya foi vencedora do Billabong XXL, a primeira mulher do mundo a dropar Ghost Threes e coleciona um número sem fim de feitos dignos dos maiores surfistas do planeta. Apesar disso, a Surfer considerou de bom tamanho fazer uma entrevista de apenas meia página com ela e ainda avacalhar todos os atletas do país da entrevistada. Assim, de graça.
Não por desforra, mas por puro respeito e admiração, o Chasing presta aqui a sua homenagem.
Stormy Monday em Mundaka - Por Carlos Lobo
Entre os dias 9 e 12 de setembro de 1993 acontecia o Pukas Fortuna Surf, etapa do WQS em Zarautz na Espanha. Não me lembro muita coisa da competição em si, mas me recordo que na manhã de domingo a final foi vencida por Mark Bannister numas merrecas de centímetros, quase insurfáveis, e por ironia logo depois o mar começou a subir muito rápido. No meio do dia já estava enorme com ondas fechando em toda a extensão da praia. Naquela mesma tarde a meca do surf mundial saiu numa grande caravana rumo a Portugal, sede da próxima etapa. No meio do caminho havia Mundaka. Estava indo sozinho no meu carro/casa quando alguém pediu que eu desse carona pra um moleque peruano magrinho que devia ter uns 18 anos. No caminho Cristian me contou várias histórias sobre as ondas no Peru, principalmente Pico Alto. Dizia que já tinha surfado ondas enormes lá e eu fiquei achando que era meio cascata. Chegamos na vila de Mundaka de noite e fomos direto para a mureta do porto aonde já tinha um monte de gente encasacada olhando o mar. Não dava pra ver as ondas, mas o som do mar era ensurdecedor e a adrenalina estava em todos os olhares. Estacionei meu carro ao lado do furgão azul da galera de Ubatuba onde o Datinho, irmão do Tadeu Pereira, tinha pintado na lataria um enorme “ROTA”, numa alusão a temida polícia paulistana. Dormiam nele o Mariano Tucat, o Renatinho e o Peterson Rosa, as novas promessas do surf brasileiro. Naquela noite todo mundo foi dormir meio grilado. Ainda estava meio escuro quando acordei com os gritos do Peterson que já estava de longjohn convocando todo mundo pra ir pra água. O dia estava cinzento e frio e fui ver o mar. As ondas estavam enormes, devia ter no mínimo uns 15 pés, e o mar totalmente storm e mexido, a água barrenta e fria. Nessas horas não deve ser nada bom ser surfista profissional, a pressão sobre os caras era evidente, mas a verdade é que entre a tropa de elite do surf mundial, que neste momento já lotava a mureta, não havia movimentação que indicasse que alguém iria encarar o desafio. E não faltava motivo. O cenário era apocalíptico. Mundaka quebra na foz de um grande rio e naquele dia o mar estava tão grande que literalmente arrancou das margens árvores de um bom tamanho e a situação era a seguinte: as árvores boiando eram carregadas pelas ondas rio adentro até chegarem no canal quando encontravam uma correnteza no sentido contrário que as levavam de volta pra debaixo do pico num circuito interminável. Ou seja, o medo não era só de dropar ondas enormes e mexidas, precisava ainda ficar ligado pra não “arborizar”, pegando emprestado um termo do vôo livre. Eu estava ao lado da marina, uma enseada bem pequena construída artificialmente com muros de pedra pra proteger os barcos dos pescadores. Um grande volume de água entrava e saía dela criando um sistema de fluxo e refluxo assustador. De repente vi uma das cenas mais incríveis da minha vida. Formou-se um redemoinho no meio da enseada que simplesmente tragou uma traineira de pesca robusta de uns dez metros como se fosse de brinquedo. O barco não afundou, ficou boiando com o casco virado pra cima e foi expulso da marina. Agora não tinham somente árvores pra desviar, havia uma traineira que sumia e reaparecia repentinamente no meio das ondas. Bom, mas sempre tem um maluco. Neste caso tinham quatro. Peterson, apesar de ser muito novo já justificava o apelido de “Bronco” e foi o primeiro a ir pra água sem nenhuma hesitação. O peruano magrinho pra quem dei carona era “cascudo” mesmo e foi o segundo a cair. Teve mais um surfista espanhol, se não me engano Dani Garcia, e por último, Johnny Boy Gomes, que apesar do status de lenda havaiana deu uma senhora miguelada. Ficou dez minutinhos dentro d’água, entrou numa onda já meio que virando pra sair e voltou remando pra marina mostrando uma quilha quebrada e tratou de sumir do mapa. Os outros três fizeram um autêntico show pra galera que ia ao delírio a cada drop suicida, a cada colocada pra dentro insana e a cada desviada das árvores ou do barco. No final da tarde o mar já começaria a baixar e no dia seguinte Mundaka quebrou grande ainda, mas perfeito, e os pros deram então seu espetáculo apesar dos tubos mais profundos serem sempre dos locais espanhóis que passavam a onda inteira entocados. Eu, surfista calhorda, só fui cair no outro dia quando as ondas amanheceram com aturáveis 1,5 m e mesmo assim passei sufoco, pois a onda é muito oca e rápida, o terral é forte e dificulta o drop e a correnteza cansativa. Foi muita sorte poder surfar por dois dias uma onda lendária como Mundaka, mas ter testemunhado de camarote aquela stormy monday september session talvez tenha sido a grande recompensa desta trip.
Por incrível que pareça não tenho nenhum registro deste dia, mas fuçando no Youtube encontrei 2 filminhos que ajudam a dar uma idéia do power do lugar.
Por incrível que pareça não tenho nenhum registro deste dia, mas fuçando no Youtube encontrei 2 filminhos que ajudam a dar uma idéia do power do lugar.
1.17.2008
1.12.2008
1.07.2008
1.06.2008
DNA
Não me lembrava bem por que tinha começado a escrever o Chasing. Dia primeiro de janeiro, lá pelas 2h30 da manhã, caminhando pelo Malecón (Havana, Cuba), me lembrei: eu queria pedir demissão.
Eu tinha decidido o seguinte: tenho uma viagem marcada para as Mentawaii em abril com uns amigos. Passaremos 14 dias num barco como já fizemos há 2 anos atrás. Fico no barco, depois vou pra Bali e, de lá, rodo pela região - e isso incluiria Vietnã, India e sei lá mais o quê - por uns 3 meses e de volta ao Brasil, procuraria um novo emprego. Para um cagão de carteira assinada e plano de saúde como eu, acreditem, isso é como contar pro pai que se é viado.
Tenho um puta medo de ser demitido, ficar sem emprego, sem dinheiro, perder a porra toda - essas babaquices. Mas o surfe muda tudo e talvez, por ele, eu vencesse a vocação para o CEP/CPF/RG/VGBL que tenho no meu DNA.
Tudo ia bem. Mês a mês eu reunia dinheiro, coragem, informação e motivos que me deixassem de saco ainda mais cheio com o objetivo de tornar o pedido de demissão mais fácil.
A função do Chasing era preencher intelectualmente esse espaço de tempo que ficaria longe do trabalho e perto da vida lá fora. Meus amigos teriam algum contato com o meu dia-a-dia, meus parentes saberiam que eu estaria vivo, corado e gordinho e os desconhecidos teriam mais alguma coisa para ler ou seguir - desculpem a pretensão a lá Ralah Ricota.
No meio do caminho, meus dois chefes me chamam numa sala, miram no meio da minha testa e disparam o gatilho. "Você foi promovido."
Numa reviravolta dramática, aos 30 minutos do segundo tempo, o coquetel CEP/CPF/RG/VGBL, com o reforço de alguns fios de cabelo branco, mudam o rumo do jogo e deixam o Maracanã lotado dos meus anseios revolucionários em um silêncio digno de funeral de indigente. Sem choro, nem vela. Sem tempo pra escrever pro blogue também.
De volta ao Malecón, com a cabeça cheia de morritos e procurando um clichê de resolucão de ano novo, decido tentar mais uma vez. Tenho que conseguir escrever um pouquinho que seja. O blogue nunca deixou o meu surfe melhor, nem me tornou mais rico. Mas platéia também é espetáculo e daqui do ar-condicionado, escrevendo para o Chasing, me sinto um pouquinho mais perto de quem tomou coragem, pediu demissão e está em alguma praia do mundo esperando por uma onda.
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