POR CARLOS LOBO
No início de 93, trabalhava numa agência de propaganda em Sevilla quando o dono me chamou para uma conversa com final previsível, haviam perdido a maior conta da agência. Tinha uma graninha guardada e fiquei mais feliz do que preocupado. Começava então uma fase totalmente like a rolling stone na minha vida. O primeiro “compromisso” foi um Festival de Rock com Bob Dylan e John Mayall, em La Coruña. Como já estava pelo norte, resolvi passar uma temporada em Gijon na casa de conhecidos que tinham uma fábrica de pranchas em frente a uma praia de nudismo com altas ondas. Este estilo easy rider ganhou um upgrade com a compra de um velho Seat 82. Fiz umas camisetas pra vender e fui pra Cote Basque, na França, metade do tempo era camelô, a outra metade, estava dentro d’água. O negócio prosperou, virei receptador do “contrabando” que os atletas profissionais traziam do Brasil, revendia pranchas, shorts, camisas, mochilas e streps nos calçadões por onde passava o circuito do WCT e WQS. Tirei o banco do carona do carro e no espaço que ele ocupava adaptei uma cama, o porta-malas, acrescido de uma caixa de papelão e um fogareiro, virou a cozinha, e com este motorhome improvisado a saúde financeira da lojinha estava resolvida. O maior item da planilha de custos eram as cervejas na noitada. Seguindo a caravana do circuito mundial passei por Biarritz, Lacanau, Hossegor, Zarautz, na Espanha, peguei um Mundaka épico e fui parar em Portugal. Nove meses depois estava de volta a Sevilla, minha base. O que fazer? A cidade vivia a ressaca do fim da Expo 92 e uma baixa total em termos de trabalho. Uma surftrip pelo Marrocos era um sonho antigo, já tinha ido 3 vezes, mas nunca pra pegar onda, porém rolava um certo cansaço da vida de mulambo andarilho. Já estava pensando em correr seriamente atrás de trabalho quando recebi um empurrãozinho do destino. Numa tarde cinzenta, sem nada pra fazer, resolvi ir no cinema ver qualquer coisa, peguei o jornal e gostei da crítica de um filme chamado Baraka. Saí do cinema sentindo que a África estava logo ali, era só esticar o braço, e não dava pra jogar fora aquela oportunidade, não haveria segunda chance. Na tarde do dia seguinte estava em Cádiz comprando uma prancha na surfshop de um brasileiro, de lá fui direto para a estação de ferryboat em Algeciras, fiz a travessia do estreito e cheguei em Ceuta, ainda território espanhol. No dia seguinte, na hora de cruzar a fronteira encrencaram com o estado do meu carro, mas fui salvo pelo velho papo “Brésil, futebol, Romariô, Bebetô…” afinal, estava todo mundo feliz com a classificação do Marrocos pra Copa de 94.
A sensação de quem entra no Marrocos é de ter voltado no tempo mil anos. Já conhecia todas as cidades históricas e rumei direto para o pequeno vilarejo de Moulay-Bousselam, primeiro surfspot de um guia improvisado com recortes de revistas de surf espanholas. Flat total. Depois de quatro dias esperando o mar subir (ainda não havia internet) rumei para Casablanca. Estacionei em frente a um beachbreak ao lado de um minarete e fui direto pra água antes mesmo de decidir onde ficar. Havia boas ondas de um metro e somente cinco pessoas dentro d’água. Na areia contei que era brasileiro e que estava ali para surfar e dois irmãos, Jawad e Kamel, me convidaram pra “cair” na casa deles. Era um apartamento bem simples na laje de uma mesquita, em quatro quartos amontoavam-se treze pessoas, seus pais e duas irmãs com os maridos e os filhos. As cinco da manhã acordávamos com os auto-falantes a todo volume convocando os mulçumanos para a primeira das cinco orações do dia. Enquanto quase todos da casa estendiam seus tapetes para Meca partíamos para o surf. A vinte quilômetros de Casablanca tem uma onda sensacional, Dar-Bouazza, uma das únicas esquerdas do país, que quebra em três sessões sobre um fundo de pedra raso e com muitos ouriços. As semanas foram se passando, fui ficando, ajudava nas despesas da casa, levava as pessoas pra lá e pra cá no meu carro e aos poucos fui conhecendo toda a comunidade do surf. Mohamed, era comissário da Royal Moroccan, estava pra tirar férias, era o único da galera que tinha carro e teve a feliz idéia de juntar os dois carros pra fazermos uma surftrip para o sul, até a região de Agadir a 530 km de distância. A “barca” estava formada. A palavra que eu mais ouvia nos dias que antecederam a partida era “secret spot”.
9.27.2007
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7 comentários:
Lobo,o verdadeiro aventureiro.Marrocos deve ser bem legal,não só pela cultura e religião,mas o que sempre me fascinou é a geografia e o visual do lugar.
Recentemente na ASL saiu uma reportagem do Marrocos com altas direitas,considerado pelo muy experiente Shane Dorian,como a the best surf trip ever!!
No aguardo pelo segunda parte e a revelação do secret spot.
Valeu,
Godum
Sem contar o filme Siping Jetstream, que tem altas imagens do Dorian e mais uma galera arrepiando por lá. A dica desse filme me foi passada pelo Carlinhos, que vai pra Mentawai agora em 2008.
Boa Lobo. Boa Carlinhos.
abrx
Felipe
Boa Lobo. Clássico ! Muito bacana. Bota logo a segunda parte. A história tava muito boa.
Abs,
Carlinhos
Muito bom Lobo!
Acho que a galera tem que variar as trips, conhecer novos lugares, como no filme que o Luchi falou. Marrocos tem altas ondas!
Abs
Gugu
lobo so far away... isso me lembrou uns amigos que fiz na costa rica, que abandonaram a cidade de natal, prepararam um carro casa, e partiram para fazer a américa latina toda, em busca de ondas e mais ondas. rota panamericana chamava a trip.
Dizem que no marrocos tem um chocolatinho muito bom também. Grande texto, grande aventura, grande experiência de vida!!!
Olha já ouvi essa estória algumas vezes e posso adiantar que o segundo capítulo é fantástico. Lobo é um verdadeiro aventureiro, dessa vez içaremos as velas do Sanssouci!!!!
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