Ouvindo:
10.08.2007
10.02.2007
Hope
Acabei de conhecer o blogue do Bruno, o Monoquilhas. Num ótimo post ele comenta o esperado Festival Alma Surf e dá uns trailers como prévia do que será exibido. Destaco aqui o First and Hope, dirigido pelos irmãos Malloy. Os caras saem d'água e caem no asfalto, traduzindo para o skate muito dos valores e olhar que criaram descrevendo o surfe. Achei o trailler abaixo muito bom.
O Mundo é um Moinho
Já que o assunto viagem tem sido uma constante aqui no Chasing, aqui vai uma dica que quem lê o Ondas já deveria conhecer, afinal, foi de lá que chupei essa informação. É o Tempo de Viajar, os cadernos de viagens de um surfista moderno. Reflexões de alguém que busca se encontrar em ondas ao redor do mundo e ao mesmo tempo permanece um estrangeiro. Para você entender o espírito, aqui vai o header do blogue: Fui para a floresta viver de livre vontade, para sugar o tutano da vida. Para, quando morrer, não descobrir que não vivi. (Henry David Thoreau).
Ficou curioso? Vai lá.
10.01.2007
Surfe pros Ouvidos
A marca Totem disponibiliza no seu site uns podcasts de primeira. Seleção fina de música boa em excelentes misturas. Hoje fui lá e baixei todos. Dica da Ticiane, amiga minha que ajuda Fred D'Orey, dono da marca, nas seleções dessas pérolas.
Marrocos. Um grand finale pro ano de 93. PARTE 2
POR CARLOS LOBO
O primeiro secret spot era uma direita incrível perto de um pico chamado que quebrava paralela a um costão de pedras, como quase todas as ondas no Marrocos. A sensação de chegar num lugar e ver ondas perfeitas quebrando sem ninguém é indescritível. Me lembro de ter ficado sozinho no fim de tarde e que não conseguia sair d’água, sempre que pegava a saideira a acabava voltando pro pico mesmo que os braços já não obedecessem mais. Paramos em mais dois secret spots que não me lembro dos nomes antes de chegarmos no vilarejo de Taghazout, perto de Agadir. Alugamos uma casa em frente ao lendário pico de Anchor Point, uma direita de sonhos em frente a ruínas que davam ao lugar uma atmosfera mágica. A poucos metros de caminhada, outras duas ondas incríveis, Mistery Point e Killer Point. A rotina era surf de manhã até o cair do dia, a noite, jantar numa travessa comunitária comendo com a mão, no melhor estilo marroquino, uma rodada de Bouarhed, tradicional jogo de cartas árabe, tomar chá de hortelã e desmaiar ouvindo o som das ondas quebrando nos costões de pedra, rezando pra que o dia seguinte fosse igual o que passou. O crowd no pico era de no máximo quinze pessoas no fim de semana, nos dias úteis as ondas eram quase só nossas. No primeiro flat que rolou pegamos os carros e fomos para as cachoeiras na Cordilheira dos Atlas, cortando as montanhas desérticas com neve eterna no topo e os oásis de palmeiras com seus pequenos vilarejos. Depois de 20 dias de ondas de todos os tamanhos o pessoal de Casablanca teve que voltar pra trabalhar. Eu fui ficando, me mudei para uma casa de uma galera que tinha acabado de vir de Portugal, onde tinha um shaper brasileiro, um hippie que fazia mandalas de arame, um surdo que falava sem parar e um australiano que quase tinha sido morto por um tubarão. O fim do ano se aproximava e sabia que um dia teria que voltar, mas adiava esta decisão indefinidamente e as semanas iam se passando até que um dia tomei uma dura da polícia que apreendeu meu carro, pois o seguro obrigatório estava vencido. Tive que me despencar de ônibus pra Casablanca, único lugar onde conseguiria renovar o seguro, uma viagem de mil quilômetros de ida e volta bastante cansativa. Na volta consegui liberar o carro, mas pra reaver minha carteira de motorista teria que comparecer à Corte em Agadir. No dia marcado para a audência tomei a estrada para lá, mas no meio do caminho simplesmente amarelei, fiz meia volta e decidi que era hora de voltar. Deixei Taghazout e peguei a estrada pro norte me sentindo um fugitivo. Algumas horas depois entrava na estradinha que levava ao primeiro secret spot com uma certa adrenalina, afinal, era um fundo de pedra, eu não sabia como estava a maré e estando sozinho se algo me acontecesse entraria para a lista de desaparecidos e minha família provavelmente nunca mais ouviria falar de mim, mas resolvi que, apesar dos riscos, merecia aquela história. Parei o carro, as ondas tinham um metro, não havia uma viva alma num raio de dezenas de quilômetros. Remei com o coração pulando no peito, mas com uma alegria imensa de estar ali. De cabeça mais do que feita voltei para a estrada, a noite morto de sono parei para dormir num camping perto de Safi. No dia seguinte, depois de mais uma esticada de algumas horas estava de novo em Moulay-Bousselam, que continuava flat, não seria naquela viagem. Reencontrei Hassan, o principal guia de birdwatching da cidade, ele precisava de ajuda, pois naquela noite haveria uma cerimônia religiosa na sua casa e as baterias de carro que eles usavam para acender as lâmpadas estavam descarregadas, só na rua principal da cidade havia luz elétrica. Problema fácil de resolver com um carro, por isso a minha chegada foi comemorada. O pai de Hassan era um sacerdote muçulmano e uma vez por ano o conselho de sacerdotes se reunia para uma cerimônia super fechada. Naquele ano a cerimônia era na sua casa, e naquela noite, por uma feliz coincidência eu fui parar ali para acompanhar de perto aquele acontecimento especial. E com aquela espécie de benção de Alah, minha viagem e aquele ano inesquecível começavam a chegar ao fim. A próxima noite já seria na Espanha e semanas depois estaria de volta ao Brasil onde a vida tomaria um outro rumo.
O Marrocos é uma ótima opção de surf pra quem quer pegar ondas sem crowd. É próximo da Europa, dá onda quase o ano inteiro e tem muitos secret spots onde se pode surfar sem ninguém em volta. A água é fria pros nossos padrões tropicais, mas não chega a ser gélida (somente no inverno), caí de shortjohn na maior parte dos dias numa boa. A direção do swell e a geografia da costa fazem com que 99% das ondas sejam pra direita, é o paraíso dos “regulars”. A maior parte dos picos são com fundos de pedras, muitas vezes sem praia, o que garante a regularidade das ondas havendo swell, mas pode rolar uns sufocos pra entrar e sair do mar e é bom ter um par de botinhas pros lugares mais complicados. Mais do que uma surftrip é uma experiência de vida bastante interessante, uma oportunidade de conviver com uma cultura milenar e rica em tradições e com um povo alegre e hospitaleiro, muito parecido com a gente. Só precisa ter um pouquinho de espírito de aventura e não se incomodar em passar alguns perrengues, afinal, como dizia Fernando Pessoa, tudo vale a pena quando a alma não é pequena.
O primeiro secret spot era uma direita incrível perto de um pico chamado que quebrava paralela a um costão de pedras, como quase todas as ondas no Marrocos. A sensação de chegar num lugar e ver ondas perfeitas quebrando sem ninguém é indescritível. Me lembro de ter ficado sozinho no fim de tarde e que não conseguia sair d’água, sempre que pegava a saideira a acabava voltando pro pico mesmo que os braços já não obedecessem mais. Paramos em mais dois secret spots que não me lembro dos nomes antes de chegarmos no vilarejo de Taghazout, perto de Agadir. Alugamos uma casa em frente ao lendário pico de Anchor Point, uma direita de sonhos em frente a ruínas que davam ao lugar uma atmosfera mágica. A poucos metros de caminhada, outras duas ondas incríveis, Mistery Point e Killer Point. A rotina era surf de manhã até o cair do dia, a noite, jantar numa travessa comunitária comendo com a mão, no melhor estilo marroquino, uma rodada de Bouarhed, tradicional jogo de cartas árabe, tomar chá de hortelã e desmaiar ouvindo o som das ondas quebrando nos costões de pedra, rezando pra que o dia seguinte fosse igual o que passou. O crowd no pico era de no máximo quinze pessoas no fim de semana, nos dias úteis as ondas eram quase só nossas. No primeiro flat que rolou pegamos os carros e fomos para as cachoeiras na Cordilheira dos Atlas, cortando as montanhas desérticas com neve eterna no topo e os oásis de palmeiras com seus pequenos vilarejos. Depois de 20 dias de ondas de todos os tamanhos o pessoal de Casablanca teve que voltar pra trabalhar. Eu fui ficando, me mudei para uma casa de uma galera que tinha acabado de vir de Portugal, onde tinha um shaper brasileiro, um hippie que fazia mandalas de arame, um surdo que falava sem parar e um australiano que quase tinha sido morto por um tubarão. O fim do ano se aproximava e sabia que um dia teria que voltar, mas adiava esta decisão indefinidamente e as semanas iam se passando até que um dia tomei uma dura da polícia que apreendeu meu carro, pois o seguro obrigatório estava vencido. Tive que me despencar de ônibus pra Casablanca, único lugar onde conseguiria renovar o seguro, uma viagem de mil quilômetros de ida e volta bastante cansativa. Na volta consegui liberar o carro, mas pra reaver minha carteira de motorista teria que comparecer à Corte em Agadir. No dia marcado para a audência tomei a estrada para lá, mas no meio do caminho simplesmente amarelei, fiz meia volta e decidi que era hora de voltar. Deixei Taghazout e peguei a estrada pro norte me sentindo um fugitivo. Algumas horas depois entrava na estradinha que levava ao primeiro secret spot com uma certa adrenalina, afinal, era um fundo de pedra, eu não sabia como estava a maré e estando sozinho se algo me acontecesse entraria para a lista de desaparecidos e minha família provavelmente nunca mais ouviria falar de mim, mas resolvi que, apesar dos riscos, merecia aquela história. Parei o carro, as ondas tinham um metro, não havia uma viva alma num raio de dezenas de quilômetros. Remei com o coração pulando no peito, mas com uma alegria imensa de estar ali. De cabeça mais do que feita voltei para a estrada, a noite morto de sono parei para dormir num camping perto de Safi. No dia seguinte, depois de mais uma esticada de algumas horas estava de novo em Moulay-Bousselam, que continuava flat, não seria naquela viagem. Reencontrei Hassan, o principal guia de birdwatching da cidade, ele precisava de ajuda, pois naquela noite haveria uma cerimônia religiosa na sua casa e as baterias de carro que eles usavam para acender as lâmpadas estavam descarregadas, só na rua principal da cidade havia luz elétrica. Problema fácil de resolver com um carro, por isso a minha chegada foi comemorada. O pai de Hassan era um sacerdote muçulmano e uma vez por ano o conselho de sacerdotes se reunia para uma cerimônia super fechada. Naquele ano a cerimônia era na sua casa, e naquela noite, por uma feliz coincidência eu fui parar ali para acompanhar de perto aquele acontecimento especial. E com aquela espécie de benção de Alah, minha viagem e aquele ano inesquecível começavam a chegar ao fim. A próxima noite já seria na Espanha e semanas depois estaria de volta ao Brasil onde a vida tomaria um outro rumo.
O Marrocos é uma ótima opção de surf pra quem quer pegar ondas sem crowd. É próximo da Europa, dá onda quase o ano inteiro e tem muitos secret spots onde se pode surfar sem ninguém em volta. A água é fria pros nossos padrões tropicais, mas não chega a ser gélida (somente no inverno), caí de shortjohn na maior parte dos dias numa boa. A direção do swell e a geografia da costa fazem com que 99% das ondas sejam pra direita, é o paraíso dos “regulars”. A maior parte dos picos são com fundos de pedras, muitas vezes sem praia, o que garante a regularidade das ondas havendo swell, mas pode rolar uns sufocos pra entrar e sair do mar e é bom ter um par de botinhas pros lugares mais complicados. Mais do que uma surftrip é uma experiência de vida bastante interessante, uma oportunidade de conviver com uma cultura milenar e rica em tradições e com um povo alegre e hospitaleiro, muito parecido com a gente. Só precisa ter um pouquinho de espírito de aventura e não se incomodar em passar alguns perrengues, afinal, como dizia Fernando Pessoa, tudo vale a pena quando a alma não é pequena.
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